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ARTIGO: Mortes violentas; Tragédia brasileira (Iran Coelho das Neves)


Mesmo com queda de 6%, Brasil registrou, em 2021, 47,5 mil mortes violentas intencionais – uma média de 130 homicídios por dia –, o que coloca o país no topo de uma trágica estatística.

Levantamento do Anuário Brasileiro de Segurança Pública revela que o país teve, em 2021, queda de 6% no número de mortes violentas, com 47,5 mil registros, contra 50,4 mil em 2020. Trata-se do menor patamar desde 2011, quando 47,2 mil vidas foram interrompidas de forma violenta.

Ainda que essa redução possa alimentar alguma expectativa de que contenção e reversão da trágica estatística possam estar em curso duradouro, definitivamente não há como não se estarrecer quando se sabe que o equivalente à população inteira de uma cidade de porte médio perdeu a vida de forma violenta em apenas um ano.

Afinal, mesmo com números em queda, o Brasil contou, a cada dia de 2021, nada menos que 130 mortes intencionais, aí incluídos homicídios, latrocínios, lesões corporais seguidas de morte e óbitos ocorridos em intervenções policiais.

De acordo com dados da ONU, citados pelo Anuário, "o Brasil é, de longe, o país com maior número absoluto de homicídios do planeta". Com uma população equivalente a 2,7% dos habitantes do planeta, o Brasil responde por 20,5% dos homicídios cometidos no mundo. Apenas Índia (40.651) e México (36.579) se aproximam do Brasil em números de mortes violentas intencionais.

Diante de panorama tão desolador, é preciso, como já dito, encontrar nessa redução de 6% nos assassinatos, verificada em 2021, alguma esperança de que o Brasil possa reduzir, de forma consistente, o índice de barbárie, de banalização da vida, de que se tornou refém, principalmente nas últimas duas décadas.

Embora apontem que essa queda deve ser creditada, em parte, a um fator demográfico – redução da população adolescente e jovem, principais vítimas da violência com morte –, e ao arrefecimento das disputas entre os grandes grupos criminosos por territórios, especialistas citam programas de prevenção à violência, experiências de integração e de gestão de forças de segurança, e o início da implantação do Sistema Único de Segurança Pública (2018) como muito importantes para a diminuição dos homicídios.

Porém, o Anuário aponta, como fator preponderante para essa redução de mortes violentas intencionais, o controle de armas e munições, assegurado pelo Estatuto do Desarmamento, adotado em 2003. "Sem ele, o crescimento da violência letal nas últimas duas décadas teria sido muito maior", observa o documento.

Em lamentável contraponto à queda de 6% no número de mortes violentas, o Anuário Brasileiro de Segurança Pública aponta uma alarmante interiorização dos crimes contra a vida. Os trinta municípios com maiores taxas de morte violenta por cem mil habitantes são todos do interior.

Desses, nada menos que treze estão na Amazônia, onde o crime organizado tem se aproveitado das condições geográficas e da ausência do estado em extensas áreas, para o tráfico de drogas e de armas, estendendo seus domínios sobre garimpos ilegais, pesca clandestina e até prostituição, segundo Renato Sérgio de Lima, presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Como se vê, a redução de 6% no número de mortes violentas em 2021, em comparação com 2020, embora signifique um pequeno alento, pouco altera o contristador cenário que situa o Brasil entre os países mais violentos do mundo.

Como nação civilizada não podemos nos acomodar enquanto todos os dias 130 pessoas são vítimas de morte violenta intencional, ou seja, assassinadas.

 

AUTOR: Iran Coelho das Neves - Presidente do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso do Sul.

 


Fonte: Iran Coelho das Neves - Presidente do TCE-MS